quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Espectadores ou discípulos?

Ser “crente” (como era conhecido o cristão evangélico), na visão do povo, era equivalente a ser analfabeto, irracional, doido, inculto, pobre, ignorante, entre outros adjetivos que nos era atribuído. Parte dessa imagem negativa nós mesmos passamos. Outra parte vem da imaginação fértil de quem está de fora, e certa parcela deve ser atribuída a Satanás, em seu afã de sempre querer depreciar a obra de Deus.

Vivíamos meio na defensiva, cheios de suspeita e desconfiança por tudo que era novo. O rádio, a TV, a política, a cultura, a tecnologia e até o avanço da ciência, eram vistos com maus olhos por alguns e considerados inimigos que deviam ser combatidos por serem armas de Satanás.

Os pobres, e quase somente eles, eram o alvo da evangelização. A igreja na sua maioria era composta de pessoas das classes menos favorecidas da população brasileira. Muita coisa era importada de outras culturas e países (músicas, instrumentos, estilo e até alguns costumes). A liturgia, usos e costumes e as práticas, eram por vezes rígidas e experimentavam mui pouca variação. Algumas chegavam mesmo a ser bizarras, outras incompreensíveis e tinha até as que eram inexplicáveis.

Mesmo os seminários, não eram bem vistos por alguns. De literatura, havia grande escassez... Os poucos livros que tínhamos eram de autores estrangeiros (infelizmente, esta é uma área que não avançamos muito até o presente e esta tendência ainda insiste em permanecer).

Visivelmente, não havia grandes atrativos na fé evangélica. Mas foi justamente neste contexto que a igreja mais cresceu, avançou, desbravou e se estabeleceu no país como a maior força religiosa do mundo. Apesar da aparente “falta de atrativos”, as pessoas afluíam aos pés de Cristo. Foi uma época de grande fervor e fortes convicções. Nos tornamos o celeiro do mundo, a maior parcela evangélica dele (até então os EUA podiam ser assim considerado - antes recebíamos missionários, hoje enviamos).

Atingimos camadas antes inalcançadas. Entramos na política, no rádio, na TV, nas faculdades, na internet (o mais recente e avançado meio de comunicação do mundo). Temos arrebanhado pessoas dos mais variados meios, como artistas, músicos, empresários, intelectuais, universitários, também homens e mulheres da alta sociedade (já se fala até num possível presidente evangélico). Temos atuado em áreas sociais como um dos principais parceiros do país na recuperação de pessoas, e cooperado ativamente em tragédias de cunho nacional que por vezes assolam a nação.

O quadro mudou, a liderança e a mentalidade também, com ele o número. Muito daquilo que importávamos, hoje exportamos. Temos agora estilo próprio, cantamos nossas músicas, adoramos e cultuamos a Deus de maneira toda nossa.

Temos nos tornado relevantes, fortes e atrativos. Hoje dá até status ser evangélico. Temos atraído multidões (o que realmente as tem atraído?), todos nos apreciam e até admiram com respeito. Alguns interpretam pensando nisto como o mundo entrando na igreja e a corrompendo, outros mais otimistas pensam, enfim, a igreja entrou no mundo para transformá-lo.

Em meio a todo este entusiasmo e euforia devido ao incrível poder de atração da igreja, é preciso algum cuidado. Não precisamos pensar se o passado ou o presente eram melhores (há sem dúvida elementos que devem ser preservados e outros substituídos), mas pensar e se perguntar: O que temos atraído para nossas igrejas? Espectadores ou discípulos?

Espectadores são atraídos pela visão, audição, pelo belo, confortável, agradável e admirável, entretanto os discípulos são atraídos pela Palavra pregada e vivida, e esta entra na mente, desce ao coração e atua na vontade, chamando a um compromisso real e à mudança de vida.

Enquanto houver shows, ali estarão os espectadores, mas eles se tornam cada vez mais exigentes e volúveis, somente com o discípulo se pode contar. Os espectadores formam as grandes multidões, discípulo às vezes são em pequeno número. Espectadores dão resultados rápidos e fáceis, pois são superficiais (são como as folhas de uma frondosa árvore), discípulos dão trabalho, gasta-se tempo, mas no fim dão frutos porque tem raízes profundas, e assim o resultado é seguro. Espectador espera, discípulo faz. Espectador gosta de ser servido, o discípulo serve...

Nem sempre Jesus se animou muito com as multidões, embora nunca as desprezasse, Ele falou algo do seu poder de atração: “E eu, quando for levantado da terra, todos atrairei a mim.” (João 12:32.)

É preciso muito cuidado se nosso principal alvo for números, estatística, grandeza ou honra, pois nem sempre indicam resultados reais ou frutos dignos. Além do que, é Jesus quem deve atrair. Não são as coisas, nem as pessoas ou as formas, nem mesmo os resultados. Então, todo cuidado é pouco, pois a atração pode ser fatal.

jubacentrointercessao@gmail.com

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